Pular para o conteúdo

MARIA MADALENA

ASSIM RELATOU MARIA MADALENA

As sombras me acompanhavam, mesmo sob a luz do sol. Meu corpo caminhava entre os vivos, mas minha alma estava cativa em grilhões que ninguém podia ver. Dentro de mim, vozes sussurravam sem cessar, zombando, me acusando, me arrastando para abismos de dor e solidão. Eu era temida por alguns, evitada por muitos e esquecida por quase todos. Nenhuma parede me abrigava, nenhum olhar me acolhia. Eu era o que restava de uma mulher despedaçada.

Vivendo em Magdala, entre becos e caminhos tortuosos, minha vida não passava de um sopro aflito. Havia momentos em que eu gritava, não com a boca, mas com o coração — clamando por libertação, sem saber a quem recorrer. Ninguém ousava se aproximar. Alguns diziam que eu estava amaldiçoada. Outros, que era castigo dos céus. Mas nenhum deles sabia o peso de carregar sete tormentos em um só espírito.

Foi então que ouvi falar d’Ele. Um homem da Galileia, que falava com autoridade e tocava os intocáveis. Diziam que curava enfermos, fazia o cego ver, e que até os espíritos maus O temiam. Meu coração, ainda envolto em escuridão, ardeu com uma centelha de esperança. Algo dentro de mim sussurrou mais alto que os demônios: “Vai ao encontro d’Ele…”

Eu O vi pela primeira vez em meio à multidão. Suas palavras eram como bálsamo derramado sobre feridas antigas. Seu olhar… oh, aquele olhar atravessava carne, passado e pecado. Ele viu o que ninguém via: minha dor verdadeira, minha alma aprisionada. E sem que eu dissesse uma só palavra, Ele falou:

— Maria…

Meu nome em Sua boca foi como um trovão silencioso. Os demônios dentro de mim estremeceram. Alguns se contorceram, outros resistiram, mas nenhum pôde permanecer. Sua autoridade não era de homens. Ele era o Filho do Altíssimo. Com uma voz firme e serena, Ele ordenou:

— Saí dela, espíritos imundos! Esta mulher é filha de Deus!

Foi como se os céus se abrissem sobre mim. Senti um peso imenso cair ao chão. Meus olhos, antes tomados de trevas, se encheram de luz. Pela primeira vez, após tanto tempo, eu respirei livre. Ele não apenas me libertou… Ele me deu um novo nome dentro de mim: amada.

Desde aquele dia, deixei tudo para segui-Lo. Caminhei entre os discípulos, ouvindo Suas palavras, testemunhando milagres, enxugando o suor de quem carregava a esperança do mundo nos ombros. Ele não me perguntou sobre meu passado. Apenas me ofereceu um futuro.

E mesmo quando o vi pendurado no madeiro, não fugi. Estive ali, chorando aos pés da cruz, como uma filha que assiste o Pai ser ferido. Mas a história não terminou ali. Porque foi a mim, uma mulher outrora tomada por demônios, que Ele apareceu primeiro após ressuscitar. E me chamou pelo nome… outra vez.